Prostituição: o embrião de uma política pública de programas de saída

O mundo foi virado do avesso com a pandemia da COVID-19: tornaram-se evidentes e exarcebaram-se as desigualdades pré-existentes. Estará a sociedade portuguesa preparada para dar uma resposta que não deixe ninguém para trás? O caso das mulheres em situação de prostituição.

Em março de 2020, chamávamos a atenção para a situação de grande vulnerablidade das mulheres em situação de prostituição. À objetificação do corpo das mulheres para a gratificação sexual dos homens e concomitante violência inerente ao sistema de prostituição, a pandemia da COVID-19 juntava agora uma “escolha” impossível: continuarem a exercer a prostituição para sobreviver, arriscando o contágio; ou parar e sofrer o agudizar da pobreza e até fome. Nessa altura, escrevíamos ao Governo Português alertando para a situação particular de extrema vulnerabilidade económica e social vivida pelas mulheres em meio prostitucional, reclamando ser urgente garantir o reconhecimento desta dimensão na resposta pública à pandemia e apresentando um conjunto de propostas de medidas.

Em junho de 2020 a Assembleia da República fazia uma audição a peticionárias pela legalização ou despenalização total do sistema de prostituição em Portugal, argumentando nós da inconstitucionalidade das propostas em apreço, e avançando com um conjunto de propostas viáveis à luz do enquadramento Constitucional e dos compromissos internacionais de Direitos Humanos assumidos pelo Estado Português.

Em julho de 2020, a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres verificando a inexistência de respostas, avançou com a contratação de um estudo diagnóstico sobre as mulheres no sistema de prostituição na região de Lisboa no âmbito das atividades do projeto EXIT | Direitos Humanos das mulheres a não serem prostituídas, a decorrer no quadro do Programa EEA Grants, Cidadãos Ativ@s, gerido em Portugal  pela Fundação Calouste Gulbenkian em consórcio com a Fundação Bissaya Barreto.  O estudo viria a ser adjudicado à Professora Doutora Maria José Núncio, investigadora responsável afiliada no ISCSP ULisboa (Instituto de Intervenção e Políticas Sociais), tendo o trabalho no terreno sido iniciado em setembro de 2020.

Em agosto de 2020, a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres voltava a chamar a atenção para as mulheres em situação de prostituição reivindincando um conjunto de medidas no âmbito dos seus contributos para a Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal, 2020-2030.

No último trimestre do ano, e em sede de discussão do Orçamento do Estado para 2021, a Assembleia da República acabaria por ser recetiva às nossas reivindicações, tendo aprovado no âmbito da Lei n.º 75-B/2020, de 31/12, artº 203º, um projeto-piloto da iniciativa da deputada Cristina Rodrigues, que visava dar resposta às relações desiguais de poder  no sistema de prostituição. Numa abordagem transformadora, o projeto de Lei da deputada fundamentava e propunha um caminho em Portugal: a criação de programas de saída do sistema de prostituição, enquanto medida de política pública. De referir que também o PAN fazia uma proposta na mesma lógica.

Em janeiro de 2021, a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres publicou os primeiros resultados preliminares do estudo diagnóstico sobre as mulheres no sistema de prostituição na região de Lisboa.

 

Conheçam aqui o policy paper nº 1 com os resultados preliminares do estudo. Mais informações aqui.

Sobre o estudo

O estudo tem por finalidade conhecer em profundidade os intervenientes e a organização do sistema de prostituição em Lisboa. Este estudo-diagnóstico será uma das bases para o desenvolvimento de uma proposta de estratégia nacional de apoio à saída das pessoas no sistema da prostituição, que operacionalize o estipulado no artº 203º da Lei do Orçamento do Estado para 2021.

Objetivo Geral:

Conhecer o sistema de prostituição em Lisboa, na dupla vertente das e dos intervenientes e da organização desse sistema, enquanto base para a definição de estratégias de intervenção específicas.

Objetivos específicos:

  1. Conhecimento das histórias de vida e trajetórias de mulheres prostituídas em Lisboa.
  2. Conhecimento indireto dos compradores de sexo.
  3. Conhecimento da organização e dinâmicas do sistema de prostituição em Lisboa.
  4. Conhecimento da ação e representações sociais de profissionais de diferentes áreas que lidam diretamente com as mulheres prostituídas.
  5. Análise de estereótipos e representações sociais acerca da prostituição, na comunicação social escrita.
  6. Elaboração de recomendações para uma estratégia com propostas de ação social e política, que consubstancie um programa de saída do sistema de prostituição.

Metodologia:

  • Entrevistas semiestruturadas a mulheres prostituídas
  • Entrevistas semiestruturadas a profissionais
  • Análise de anúncios de jornal
  • Análise de títulos de notícias

Comissão de Acompanhamento:

Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG); Instituto de Segurança Social (ISS); Instituto do Emprego e da Formação Profissional (IEFP); Polícia Judiciária; Alto Comissariado para as Migrações (ACM); Direção-Geral da Saúde (DGS); Câmara Municipal de Lisboa; Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF); Associação O Ninho; Associação de Mulheres Contra a Violência (AMCV); Movimento Democrático de Mulheres (MDM); EOS – Associação de Estudos, Cooperação e Desenvolvimento.

Equipa:

  • Coordenação: Maria José da Silveira Núncio (Professora Auxiliar ISCSP ULisboa)
  • Carla Isabel Cruz (Professora Auxiliar ISCSP ULisboa)
  • Rita Sarmento (Licenciada e Pós-Graduada em Criminologia)

Data de finalização: junho de 2021.

 

 

 

 

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