“Hack for Equality”: É tempo de colocarmos mais mulheres no mapa
Após vários anos de debate, o novo aeroporto de Lisboa será construído no Campo de Tiro de Alcochete e terá o nome de Aeroporto Luís de Camões – para não grande espanto, em Portugal, todos os aeroportos têm nomes de homens. Todos.
Perante a decisão comunicada pelo Governo em maio de 2024, uma questão impôs-se: E se o próximo aeroporto tivesse o nome de uma mulher? Este é o mote que marca o ponto de partida da nova campanha da Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres (PpDM), “Hack for Equality”, uma ação provocadora que visa combater a invisibilidade das mulheres na toponímia, nos momentos e em outros marcos do espaço público.
Assim o é pois, apesar de inúmeras mulheres terem deixado uma marca indelével na cultura, ciência, arte e história portuguesas e de representarem mais de metade da população nacional, os seus nomes continuam praticamente ausentes da paisagem urbana. Em Lisboa, por exemplo, apenas 5% das ruas têm nomes de mulheres, face a 44% com nomes de homens (a). Quando se analisam apenas as ruas com nomes de pessoas, este padrão aumenta: 91% homenageiam homens e apenas 9% homenageiam mulheres. No Porto, os dados seguem a mesma tendência: 44% dos nomes de ruas pertencem a homens, contra 4% atribuídos a mulheres (b).
Esta disparidade foi colocada no debate público com a discussão que surgiu face ao nome selecionado para o novo aeroporto. A proposta de mais um nome de um homem (que, aliás, não carece de homenagens no nosso país) levou várias cidadãs e cidadãos a questionarem: onde estão as mulheres que marcaram (e marcam) a história de Portugal? E é precisamente aqui que entra o “Hack for Equality”.
A campanha convida todas as pessoas, de forma simbólica e participativa, a colocarem mulheres no mapa – literalmente. Através do Google Maps, qualquer pessoa pode registar um aeroporto fictício em Alcochete (local previsto para a construção do novo aeroporto), atribuindo-lhe o nome de uma mulher portuguesa que mereça esse reconhecimento. No site da campanha encontram-se várias mulheres e respectivas short-bios que servem de inspiração para quem quiser colocar uma no mapa: Beatriz Costa, Maria Teresa Horta ou Catarina Eufémia são apenas alguns exemplos de figuras que poderiam, com toda a justiça, dar nome a um aeroporto nacional.
“O facto de todos os aeroportos portugueses terem nomes de homens é, por si só, sintomático de uma história que apagou, durante séculos, o contributo das mulheres. O que choca é que, perante uma nova oportunidade, continuemos a repetir o padrão, sem sequer considerar a possibilidade de homenagear uma mulher. Esta invisibilidade das mulheres na toponímia dos aeroportos, ruas e monumentos não é coincidência – é consequência de uma narrativa contada de forma enviesada e profundamente desigual. Esta campanha reivindica aquilo que é justo e evidente: que as mulheres que marcaram Portugal tenham também o seu lugar no espaço público. É tempo de corrigir esta invisibilidade histórica. É tempo de reescrever o mapa com mais igualdade.” – Joana Frias Costa, Vice-Presidente da Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres (PpDM)
Para além da dimensão simbólica, o “Hack for Equality” é também um manifesto social e político. Visa sensibilizar a sociedade portuguesa para a importância da representação justa nos espaços públicos, lançando uma crítica e propondo uma nova narrativa. Desenvolvida em parceria com as agências JUDAS, Notable., Jungle Corner e Duall Studio, a ação já está a gerar debate nos media e nas redes sociais, desafiando-nos a repensar o que (e quem) escolhemos destacar na nossa memória coletiva.
(a) Estudo realizado pelo cientista de dados Manuel Banza, “Desigualdade de Género na Toponímia de Lisboa”, 2022.
(b) Análise realizada por João Bernardo Narciso e Cláudio Lemos, “Ruas do Género”, 2022.