Evento Mulheres e Clima: A voz e a ação das mulheres pela transição verde
No dia 19 de setembro, em Coimbra, a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres (PpDM), em parceria com a Business as Nature (BasN) e como apoio da Câmara Municipal de Coimbra, realizou o evento “Mulheres e Clima: A voz e a ação das mulheres pela transição verde”. A iniciativa integra o projeto europeu coordenado pelo Lobby Europeu das Mulheres (LEM) “Women in Climate”, sendo a PpDM parceira nacional, e reuniu especialistas, decisoras e decisores de política, ativistas e empresárias para refletir sobre como integrar a igualdade entre mulheres e homens no coração da transição verde.
Manhã – Por uma Transição Verde com Igualdade
A sessão de abertura trouxe uma mensagem forte: A ausência das mulheres na tomada de decisão de combate à crise climática é um erro político!
Joana Frias Costa, Vice-Presidente da PpDM
Lembrou que as mulheres, especialmente as que vivem em contextos de vulnerabilidade económica, social e geográfica, são as mais afetadas pelas catástrofes climáticas, que, por sua vez, exacerbam desigualdades preexistentes. No entanto, continuam afastadas das mesas de decisão. A sua exclusão histórica dos centros de decisão política e económica reflete-se, assim, na ausência da perspetiva de género na formulação de políticas climáticas. Por isso, a Vice-Presidente da PpDM defendeu uma agenda feminista para a justiça climática, lembrando que a inclusão das mulheres não é simbólica, mas sim estratégica, porque sem igualdade não haverá justiça climática.
Hugo Patrício Oliveira, Presidente da 11º Comissão Parlamentar de Ambiente e Energia
Destacou que a transição energética só será justa e sustentável se for inclusiva. Sublinhou a importância da educação para que mais jovens mulheres sigam carreiras em ciência e energia, e defendeu a recolha de dados desagregados por sexo para monitorizar progressos. Reforçou ainda o compromisso da Comissão Parlamentar de Ambiente e Energia com uma transição energética sustentável e inclusiva, defendendo medidas concretas e criando espaço político para que a igualdade entre mulheres e homens se torne parte integrante da política energética nacional. Só assim, segundo o Deputado Hugo Patrício Oliveira, se pode falar de uma transição verde com igualdade, para Portugal e para a Europa.
Mary Collins, Secretária-Geral do Lobby Europeu das Mulheres (LEM)
Reforçou que as alterações climáticas não são neutras em termos de género, uma vez que o modelo económico e social dominante continua a sobrecarregar as mulheres com responsabilidades de cuidado e a excluir as suas vozes da definição de soluções. Sublinhou que projetos locais liderados por mulheres são essenciais, porque trazem profundidade e impacto duradouro às respostas à crise climática, demonstrando que pensar globalmente só é eficaz se houver ação local. Defendeu ainda que a estratégia europeia deve partir dessas experiências concretas para influenciar políticas públicas, garantindo que a justiça climática seja também, e inevitavelmente, justiça feminista, onde a igualdade deixa de ser opcional para se tornar condição de transformação.
Seguiu-se a intervenção da Keynote speaker convidada, Giovanna Badalassi (Ladynomics), perita em orçamentação sensível ao género, que trouxe para este evento uma reflexão crítica sobre a relação entre sexo e políticas climáticas, desconstruindo narrativas ainda muito marcadas por estereótipos sexistas. Explicou que, apesar da crescente visibilidade do tema, as desigualdades entre mulheres e homens continuam profundamente presentes: no acesso ao emprego verde, na participação em cargos de liderança, na distribuição dos recursos financeiros e até na perceção de quem é visto como “especialista” nas áreas do clima e da energia.
A investigadora partilhou dados e exemplos concretos que demonstram como a desigualdade entre mulheres e homens não é apenas uma questão social, mas também um obstáculo ao sucesso das próprias políticas climáticas. Sublinhou que os países que lideram nos índices de igualdade entre mulheres e homens são, em regra, os mesmos que apresentam melhor desempenho ambiental, provando que investir em igualdade é também investir em sustentabilidade.
Giovanna defendeu a urgência de uma transição verde feminista, capaz de unir justiça social e ambiental. Para isso, apontou três caminhos essenciais: uma vontade política firme e corajosa; orçamentos públicos sensíveis ao género (que permitam financiar medidas concretas e não apenas declarações de princípio); e uma maior liderança das mulheres a todos os níveis, desde as comunidades locais até às instituições internacionais.
Concluiu a sua intervenção com uma mensagem clara: sem igualdade, a transição verde será sempre incompleta; mas com as mulheres no centro, será uma oportunidade de transformação verdadeiramente justa e duradoura.
Seguiu-se a mesa-redonda “O Nexus Mulheres-Clima”, moderada por Maria Sepúlveda, Técnica de Projetos e Gestão do Conhecimento da PpDM, que promoveu um debate em torno das interseções críticas entre igualdade entre mulheres e homens e a crise climática, o chamado “nexus mulheres-clima”.
Esta conversa foi informada pelos resultados do questionário aplicado no âmbito do projeto Women in Climate, partilhado entre as coordenações nacionais do LEM e organizações da sociedade civil a nível europeu, focando-se em temas-chave e nos principais desafios e lacunas identificados.
Carina Quaresma, Presidente da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG)
Sublinhou que a igualdade entre mulheres e homens não pode ser um adereço, mas sim um eixo estruturante em todas as políticas climáticas. Recordou que, quando as mulheres estão presentes nos processos de decisão, as soluções são mais inclusivas, inovadoras e eficazes. Destacou ainda exemplos de parcerias entre organismos públicos e sociedade civil que têm demonstrado como a integração da perspetiva de género acrescenta valor às estratégias climáticas, reforçando a ideia de que as mulheres são agentes ativas de transformação, e não apenas vítimas das consequências da crise ambiental.
Susana Escária, Chefe do Gabinete de Planeamento e Prospetiva da Agência para o Clima
Trouxe ao debate a visão estratégica da administração pública, enfatizando que os projetos liderados por mulheres têm mostrado uma enorme capacidade de conjugar rigor científico com empatia e práticas de governança participativa. Susana Escária partilhou que a Agência para o Clima (ApC) está a preparar um conjunto de períodos de programação de financiamento nacionais e europeus, incluindo um plano social para o clima e o novo mecanismo financeiro para o espaço económico europeu no programa transição verde. Para além da qualidade técnica, sublinhou que estas iniciativas tendem a ser mais inclusivas e a mobilizar as comunidades, o que aumenta a sua sustentabilidade a longo prazo. Defendeu, por isso, a necessidade de abrir espaço para mais mulheres em posições de liderança nas políticas e projetos climáticos, como forma de potenciar resultados e acelerar a transição verde.
Alexandra Silva, Coordenadora de Projetos e Investigação na PpDM
Reforçou o papel insubstituível das organizações de mulheres na construção, monitorização e avaliação de políticas públicas. Explicou que estas organizações, muitas vezes próximas das comunidades, têm a capacidade de visibilizar desigualdades escondidas e propor soluções concretas, que combinam conhecimento técnico com experiência vivida. Sublinhou que, sem a voz e o contributo destas organizações, as políticas correm o risco de perpetuar desigualdades e excluir determinados grupos de mulheres, em vez de promoverem de facto uma justiça climática.
Elisabete Ferreira, Diretora Executiva do Pão de Gimonde e Guardiã da Natureza
Trouxe um testemunho do terreno, mostrando a força transformadora das mulheres em contextos rurais. Partilhou como, através de iniciativas locais, é possível recuperar tradições, valorizar os recursos naturais e criar modelos de sustentabilidade que têm impacto real no território e na vida das pessoas. Lembrou que o conhecimento das mulheres rurais é motor essencial para a preservação da natureza e para a criação de novas oportunidades de desenvolvimento sustentável.
O painel seguinte, Compromissos Europeus e Internacionais, moderado por Ana Rita Brito (Associação Akto | Direitos Humanos e Democracia), trouxe perspetivas globais e multilaterais sobre a ligação entre mulheres e clima.
Pedro Oliveira, Vice-Presidente do Instituto Camões
Lembrou que o empoderamento das mulheres é estratégico para o sucesso da mitigação e da adaptação climática, já que a exclusão das mulheres e raparigas representa uma perda de talento e de inovação em áreas críticas. Referiu ainda que Portugal tem vindo a defender, nos fóruns internacionais, uma visão integrada em que igualdade e sustentabilidade caminham lado a lado, e garantiu que essa posição continuará a ser afirmada em espaços como a próxima COP30, no Brasil.
Catarina Martins, Eurodeputada e membro da Comissão do Ambiente, do Clima e da Segurança Alimentar
Aprofundou as razões pelas quais as mulheres são particularmente afetadas pelas alterações climáticas, desde a maior vulnerabilidade económica até à responsabilidade acrescida no trabalho do cuidado. Sublinhou que qualquer resposta eficaz à crise climática deve partir deste diagnóstico e, por isso, defendeu políticas que valorizem o conhecimento comunitário, que redistribuam de forma justa o trabalho de cuidado e que garantam soluções habitacionais sustentáveis e acessíveis. Só assim, frisou, será possível falar verdadeiramente de uma transição justa.
Cecilia Carcelén, Gender 5 Plus
Apresentou o trabalho de advocacia feminista que a sua organização tem vindo a desenvolver no campo climático, dando exemplos concretos de como influenciam agendas políticas e de como promovem a capacitação de mulheres para intervir e liderar nestes espaços. A sua intervenção evidenciou a importância de ter redes internacionais feministas ativas e articuladas, que possam unir esforços em torno da justiça climática.
Susana Viseu, Presidente da Business as Nature (BasN)
Encerrou o painel com uma mensagem inspiradora: lembrou que cada projeto local liderado por mulheres é uma gota que, ao multiplicar-se, se transforma em rios e, mais tarde, em oceanos de mudança. Mostrou como estas iniciativas já estão a gerar impacto real em várias regiões do país, mas alertou para a necessidade de criar pontes através de políticas públicas estruturais, sem as quais o efeito transformador se poderá perder. Sublinhou assim que só uma articulação entre ação de base e políticas institucionais permitirá consolidar uma verdadeira transição verde feminista.
Carla Rodrigues, Secretária de Estado Adjunta da Juventude e da Igualdade
O encerramento da parte da manhã esteve a cargo da Secretária de Estado Adjunta da Juventude e da Igualdade, Carla Rodrigues, que sublinhou que a transição verde e a igualdade entre mulheres e homens não são causas paralelas, mas forças interdependentes. Destacou a relevância da Agenda 2030, reforçando que não existe sustentabilidade sem igualdade entre mulheres e homens.
“A transição verde só fará sentido se for justa e inclusiva, com a participação ativa das mulheres e da juventude. Só assim construiremos um futuro mais verde, mais justo e verdadeiramente sustentável.”
Tarde – Encontro Nacional das Guardiãs da Natureza
A tarde foi dedicada ao Encontro Nacional das Guardiãs da Natureza, um espaço de partilha, inspiração e construção coletiva. Mulheres de todo o país reuniram-se para apresentar projetos inovadores nas suas comunidades, abordando áreas como turismo sustentável, agroecologia, conservação da natureza, educação ambiental, saúde e bem-estar.
Foram apresentadas 12 iniciativas, ligadas ao turismo sustentável, à agroecologia e conservação da Natureza, à educação ambiental, saúde e bem-estar.
O encontro, que contou com a participação do Secretário de Estado do Ambiente, João Manuel Esteves, do Secretário de Estado das Florestas, Rui Ladeira e do Presidente da Câmara de Coimbra, José Manuel Silva, incluiu momentos musicais, apresentações e debates que destacaram boas práticas e experiências locais, promovendo a troca de conhecimento e a valorização do trabalho das Guardiãs. Paralelamente, houve uma mostra de produtos e serviços desenvolvidos pelas Guardiãs, bem como oportunidades de networking que fortaleceram laços e abriram caminhos para futuras colaborações.
Veja aqui todas as iniciativas apresentadas.
O Encontro reforçou o papel das mulheres como agentes de mudança na preservação ambiental e no desenvolvimento sustentável, celebrando o compromisso coletivo com a natureza e as comunidades.
Para assistir ao evento “Mulheres e Clima: a voz e a ação das mulheres pela transição verde” na íntegra, basta aceder ao vídeo disponível aqui.