Conselho Internacional de Mulheres: Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres decide avançar para Conselho Nacional em Portugal

Pela segunda vez na história do movimento feminista português, uma organização de mulheres em Portugal decide oficialmente ser federada no Conselho Internacional de Mulheres (CIM), para vir a ser brevemente o Conselho Nacional de Portugal no CIM – organização fundada no séc. XIX e amplamente reconhecida como um bastião do movimento feminista internacionalista.

Depois da adesão do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas (1914-1947), que teve em Maria Lamas uma das suas mais famosas presidentes e militantes, é agora a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres (PpDM) que, respeitosa e comprometidamente, assume tão rico legado. Assim, em Lisboa, no passado dia 12 de novembro de 2022, data da última Assembleia Geral da PpDM, foi votada, por unanimidade, a sua adesão ao Conselho Internacional de Mulheres.

Conselho Internacional de Mulheres, 1904

O Conselho Internacional de Mulheres (The International Council of Women) é a primeira organização de mulheres a atuar no cenário internacional, fundado em 1888, em Washington, nos Estados Unidos.

Inserido na primeira vaga feminista e profundamente caracterizado pela causa sufragista, o CIM visava a criação de conselhos nacionais em cada país, de forma a fortalecer a luta pela igualdade entre mulheres e homens e contra as injustiças sociais, políticas e económicas cometidas contra mulheres e crianças, numa perspetiva global e transnacional. Cinquenta e três organizações de mulheres de nove países diferentes estiveram representadas neste primeiro encontro. Assim, e até hoje, o CIM visa reunir organizações de mulheres de todos os países, promovendo os Direitos Humanos, a igualdade, a paz e a participação ativa das mulheres em todas as esferas da vida, pública e privada, por meio do estabelecimento de uma federação internacional, ou plataforma de Conselhos Nacionais.

O CIM assumiu um papel central na instauração do valor universal de igualdade entre mulheres e homens na própria fundação das Nações Unidas, tendo, à época, já desenvolvido vasto trabalho com a Liga das Nações. Neste âmbito, continua a trabalhar em estreita colaboração com as Nações Unidas em questões que dizem respeito ao acesso à saúde, bem-estar, paz, igualdade, educação, clima, migrações, violência masculina, discriminação múltipla, tráfico, pobreza e direitos das mulheres, crianças e refugiadas/os. A rede global do CIM é um poderoso símbolo de solidariedade internacionalista, diálogo e cooperação intercultural, certamente pré-requisitos para a paz.[1]

Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, Lisboa, 1928

As feministas já o sabiam em 1914: o movimento das mulheres não terá sucesso duradouro sem a solidariedade além-fronteiras e esforço concertado por melhorias e avanços de uma frente unida e ampla. Afinal, a discriminação com base no sexo é estrutural e abrange todas as esferas da vida, de todas as mulheres e raparigas, em todas as partes do mundo. Não será por isso de estranhar que é logo no primeiro ano de existência do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas (CNMP) que se assume formalmente a ligação ao CIM, na quinta assembleia quinquenal, em Roma, onde o CNMP é admitido no CIM como Conselho Nacional em Portugal.

Com a sua internacionalização, o Conselho [CNMP] pretendia contribuir para alcançar a mudança na situação social e política das mulheres e conseguir assim atingir os objetivos que estabelecera na sua fundação. Tinham consciência de que no plano social a elevada taxa de analfabetismo, mais elevada entre as mulheres, era um grande entrave ao programa de ação do movimento feminista. (…) São sistemáticas as solicitações para a participação do CNMP em eventos feministas internacionais, (…) facto que permite aferir a manutenção das relações com o movimento feminista internacional.

COSTA, Rosa C. “História do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas.” Tinta da China. Lisboa, 2021.

Importará referir que é o CNMP que, sob a presidência de Maria Lamas, forma a Comissão Organizativa do Movimento Abolicionista Português (COMAP), cujo principal objetivo era “estudar os meios de intensificar uma campanha abolicionista em Portugal, combater a prostituição em geral, e muito especialmente o sistema regulamentar meretrício.” Quase cem anos depois, são as organizações da sociedade civil, e muito em particular as organizações de mulheres que, incansavelmente, se batem por essa mesma causa, conscientes da violação grosseira dos Direitos Humanos que o sistema de prostituição representa, e comprometidas pela emancipação das mulheres e pela implementação do modelo da igualdade em Portugal. Pela parte da PpDM não arredaremos pé.

Ora, a última participação do CNMP num congresso internacional data de 1938, o que se explica pela instabilidade política mundial. O próprio CNMP é dissolvido menos de dez anos depois, em 1947, e perde-se a ligação entre o CIM e Portugal.

Durante 75 anos Portugal não se viu representado no Conselho Internacional de Mulheres. Em 2022 retomamos esta ligação, conscientes de que enfrentamos desafios diferentes e diversos, mas certas da justeza da causa que nos une a todas – aqui e além-fronteiras, em 1914 e em 2023.

Assim, a PpDM reafirma o seu profundo orgulho e sentido de responsabilidade na decisão de ser Conselho Nacional do Conselho Internacional de Mulheres. Há 135 anos que o CIM mantém firme o seu compromisso com a emancipação de todas as mulheres, em todas as partes do mundo, através da cooperação internacional e de uma abordagem feminista internacional. É esta, também, a nossa tarefa.

Conselho Internacional de Mulheres, 2020


[1] GUBIN, Eliane e MOLLE, Leen Van – “Women Changing the World. A history of the International Council of Women.” Éditions Racine. Bruxelas, 2005.

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