Associações de mulheres denunciam: declaração de consenso de Genebra é contrária ao direito europeu e internacional
Estados Unidos da América, Brasil, Egito, Hungria, Indonésia, Uganda e 26 outros países unem-se contra os direitos das mulheres e raparigas.
Uma coligação de governos de 32 países contra o direito à IVG é um sinal contrário à vontade global das mulheres de transformarem as sociedades.
Em 22 de outubro de 2020, 32 países, liderados pelos Estados Unidos, Brasil, Egito, Hungria e Uganda, realizaram uma cerimónia virtual de assinatura da “Declaração de Consenso de Genebra” sobre “Promoção da Saúde da Mulher e Fortalecimento das Famílias”.
Declaração do Coletivo Feminista para o Fórum Geração Igualdade – Pequim+25 que a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres integra:
Denunciamos o perigo deste texto, que defende que “Não existe um direito internacional à IVG, nem qualquer obrigação por parte dos Estados de financiar ou facilitar a IVG”.
Esta coligação invoca o texto da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (Cairo 1994), ao referir que “o aborto não deve, em caso algum, ser proposto como um método de planeamento familiar”. Deve ser lembrado que a IVG nunca foi considerada um método de planeamento familiar: este é simplesmente um argumento recorrente pelos que se opõem a este direito das mulheres.
Esta Declaração elogia o mérito de uma “parceria harmoniosa entre mulheres e homens (…) essencial para o seu bem-estar e das suas famílias”. Esta frase, que está incluída na Declaração de Pequim (1995), é aqui novamente desviada do espírito geral de Pequim (1995). Implica que mulheres e homens são parceiros, suscitando, no entanto, todas as interpretações possíveis, incluindo a de uma divisão estereotipada de papéis sociais que bloqueia os membros da família nos papéis rígidos de outras épocas.
O discurso de “promover a contribuição essencial das mulheres para a saúde e o fortalecimento da família” é o discurso que obscurantistas religiosos e regimes totalitários sempre mantiveram sobre o papel da mulher na sociedade. Está muito distante da diversidade da parentalidade na atualidade em muitos países, incluindo em França e em Portugal, e nem considera o caso de famílias do mesmo sexo.
Recordamos os perigos da proibição da IVG para a saúde das mulheres e raparigas. Os números da OMS são muito claros: a gravidez indesejada continua a ser um enorme problema de saúde pública. Em todo o mundo, 74 milhões de mulheres sofrem gravidezes indesejadas todos os anos. Tal resulta em 25 milhões de abortos inseguros e 47.000 mortes maternas por ano. Isso permite-nos dizer que uma mulher morre das consequências de um aborto clandestino a cada 11 minutos.
Deve ser lembrado que uma política de saúde para as mulheres e raparigas requer uma combinação de educação sexual, direito à contraceção e direito à IVG. Esta é a reivindicação de todas as mulheres que lutam pelo seu direito de decidir quando e quantas vezes querem engravidar.
É a luta das mulheres na Argentina, é a luta das mulheres na Polónia que, desde 22 de outubro, viram negada a possibilidade de interromperem uma gravidez, mesmo em casos de malformação do feto – a implementação da lei encontra-se em stand by. Este retrocesso nos direitos das mulheres à IVG é um importante indicador da ascensão de regimes políticos conservadores e antidemocráticos que visam a dominação patriarcal.
As mulheres em todo o mundo estão a exigir uma transformação global em direção à igualdade real entre mulheres e homens em todas as esferas, um mundo sem violência e desigualdade, num movimento sem precedentes na História.
Em todos os locais, e este é um problema global, “As mulheres exigem uma transformação profunda” “a partir das bases”, um facto sem precedentes na história”, – Eva Illo uz (Le Monde 16 de outubro de 2020).
Por todo o mundo, as mulheres e as raparigas constituem um movimento global pela igualdade exigindo profundas transformações sociais, desafiando as atuais estruturas de poder dominadas pelos homens.
Quarenta e seis anos depois de a França ter permitido a IVG, e treze anos depois de Portugal ter despenalizado a IVG a pedido da mulher até às 10 semanas, reafirmamos mais uma vez como esse direito é um passo fundamental para a igualdade de direitos entre mulheres e homens. O direito à IVG não é apenas parte do direito à saúde, é também um fator imprescindível para o direito à emancipação das mulheres e raparigas e uma etapa essencial na marcha rumo à democracia.
Subscrevem:
Plataformas nacionais de organizações feministas:
- LA CLEF – Coordenação Francesa do Lobby Europeu das Mulheres
- CNFF – Conselho Nacional das Mulheres Francesas
- LEM ESPAÑA – Coordenação Espanhola do Lobby Europeu das Mulheres
- FNSF – Rede Federação Nacional Solidariedade Mulheres
- GLWR – Liga Helénica para os Direitos das Mulheres
- PPDM – Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres
ONG’s internacionais feministas:
- AFEM – Associação de Mulheres da Europa Meridional
- AIF – Aliança Internacional das Mulheres
- CECIF – Centro Europeu do Conselho Internacional das Mulheres
- CIAMS – Coligação Internacional para a Abolição da Maternidade de Substituição
- GEFDU – Grupo Europeu das Mulheres Diplomadas das Universidades
- ZEROMACHO
- YWCA – Associação de Jovens Mulheres Cristãs
Associações feministas francesas:
- ADEQUATIONS
- ADMINISTRATION MODERNE
- ASSOCIATION DES FEMMES DIPLOMEES DES UNIVERSITES (AFFDU)
- AMICALE DU NID
- ASSOCIATION NATIONALE DES ETUDES FEMINISTES
- BIODIVERSITY FOR PEACE
- BUSINESS PROFESSIONAL WOMEN (BPW FRANCE)
- BURKINA BIIGA
- CENTRE EVOLUTIF LILITH ASSOCIATION LESBIENNE FEMINISTE
- CHIENNES DE GARDE
- COLLECTIF ET RESEAU FEMINISTE RUPTURES
- CQFD LESBIENNES FEMINISTES
- DU CÔTÉ DES FEMMES
- FEMMES AU-DELA DES MERS
- FEMMES DU MONDE ET RECIPROQUEMENT
- FEMME DIGNE
Descarregue o original do comunicado à imprensa em francês aqui.
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