A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e os Direitos das Mulheres na Europa

A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e os Direitos das Mulheres na Europa

Nos dias 19 e 20 de setembro de 2019, a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres está a organizar uma série de iniciativas para salientar a importância da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia no que diz respeito à igualdade entre mulheres e homens na Europa.

O projeto Connect Europe

Estas iniciativas enquadram-se no projeto Connect Europe, que visa envolver as cidadãs os cidadãos e organizações da sociedade civil representantes de sete países europeus num diálogo construtivo sobre o futuro da Europa e garantir os valores fundamentais da UE constantes da sua Carta dos Direitos Fundamentais.

As organizações envolvidas neste projeto, e cujos representantes estarão presentes nos vários eventos dos dias 19 e 20 de setembro, são:

Cada organização parceira do projeto está a debruçar-se sobre uma área prioritária, sendo que a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres (PpDM) ficou responsável pelo capítulo da Igualdade da Carta dos Direitos Fundamentais, que consagra a igualdade entre mulheres e homens na União Europeia.

As mulheres e a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia

A Carta dos Direitos Fundamentais é um documento que consagra no direito comunitário um conjunto de direitos pessoais, cívicos, políticos, económicos e sociais de que são titulares as pessoas que se encontrem na UE e, relativamente a algumas matérias – como as relativas a cidadania ou trabalho – às e aos cidadãos nacionais de Estados membros da UE ou pessoas aí residentes.

A Carta inclui os direitos mencionados na jurisprudência do Tribunal de Justiça da UE, os direitos e liberdades consagrados na Convenção Europeia dos Direitos Humanos, e outros direitos e princípios resultantes das tradições constitucionais comuns dos países da UE e outros instrumentos internacionais. Estes direitos foram atualizados ao serem incluídos na Carta, à luz das mudanças na sociedade, do progresso social e do desenvolvimento científico e tecnológico.

A Carta tornou-se juridicamente vinculativa na UE com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa em dezembro de 2009, tendo agora o mesmo valor jurídico que os Tratados da UE. Consagra a igualdade entre mulheres e homens na União Europeia:

Artigo 23.º

Igualdade entre homens e mulheres

Deve ser garantida a igualdade entre homens e mulheres em todos os domínios, incluindo em matéria de emprego, trabalho e remuneração.

O princípio da igualdade não obsta a que se mantenham ou adotem medidas que prevejam regalias específicas a favor do sexo sub-representado.

A formulação deste artigo obriga a UE e os seus Estados-Membros a combater todas as formas de discriminação contra as mulheres, tais como a desigualdade salarial, e posiciona-se a favor de medidas que garantam a representação do sexo sub-representando, tais como a definição de um limiar de paridade relativo à participação política.

A inclusão deste artigo deveu-se ao trabalho de várias organizações não-governamentais de mulheres (ONGDM) por toda a Europa e também em Portugal.

Resenha histórica do papel das ONGDM portuguesas 

O colectivo das ONGDM portuguesas representadas no Conselho Consultivo da então Comissão para a Igualdade e Direitos das Mulheres (CCCIDM) na sua qualidade de Coordenação Portuguesa para o LEM – Lobby Europeu de Mulheres – (CPLEM) e para a AFEM – Association des Femmes de l’Europe Méridionale – (CPAFEM) acompanharam estreitamente o processo que conduziu à aprovação da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e pronunciaram-se sobre a evolução dos trabalhos no âmbito da Convenção* encarregue sua redação.

As pessoas e organizações mais directamente envolvidas neste processo foram:

  • Ana Coucello – Presidente da AFEM; membro efectivo do Conselho de Administração do LEM; Representante da Aliança para a Democracia Paritária no CCCIDM.
  • Isabel Cruz – Membro efectivo da Assembleia Geral do LEM; Representante da Associação “Mulheres e Desporto” no CCCIDM.
  • Ana Sofia Fernandes – Membro efectivo da Assembleia Geral do LEM; Coordenadora Nacional da rede “Jovens pela Igualdade de Oportunidades entre Mulheres e Homens” ; Representante do Graal no CCCIDM.
  • Alice Frade – Membro suplente da Assembleia Geral do LEM; Representante da APF, Associação de Planeamento Familiar no CCCIDM .
  • Maria Alzira LEMOS – Membro do Conselho de Administração da AFEM; Representante da IF, Intervenção Feminina, no CCCIDM.
  • Helena Pinto – Presidente da UMAR, União de Mulheres “Alternativa e Resposta”; Membro suplente do Conselho de Administração do LEM; Representante suplente da UMAR no CCCIDM.

Sumariamente foram as seguintes as principais iniciativas então desenvolvidas:

1 – Colaboração na formulação das cinco declarações elaboradas pela AFEM e dirigidas à Convenção com a respectiva posição acerca das matérias em debate. Estas posições foram presentes ao Praesidium e circuladas aos membros da Convenção com as seguintes cotas:

CHARTE 4120/00 CONTRIB 16 de 03FEV00

CHARTE 4157/00 CONTRIB 42 de 17MAR00

CHARTE 4172/00 CONTRIB 55 de 22MAR00

CHARTE 4231/00 CONTRIB 105 de 18ABR00

CHARTE 4314/00 CONTRIB 181 de 24MAI00

2 – Elaboração e envio ao Presidente da Comissão de Assuntos Europeus da AR de documento inventariando explicativamente as posições tomadas pelas ONGDM sobre o projecto de CDFUE na oportunidade da preparação da audição pública sobre a CDFUE, organizada por esta Comissão Parlamentar e realizada em Coimbra, em 21 de Setembro de 2000. Este documento foi posteriormente publicado pela AR.

3 – Participação e apresentação das posições atrás referidas

  • No encontro debate sobre a CDFUE que reuniu na Fundação Gulbenkian em Lisboa, em 21 de Junho de 2000, as/os Representantes das ONG portuguesas que integram a Plataforma Europeia das ONG do Sector Social;
  • Na conferência organizada pela AFEM que reuniu em Paris, em 21 de Setembro de 2000, as/os representantes dos Parlamentos e dos Governos dos cinco Estados Membros Meridionais da UE na Convenção.

* A constituição de uma Convenção com o objectivo de redigir uma Carta dos Direitos Fundamentais da UE decorre de decisões adoptadas, designadamente quanto à sua composição e mandato e métodos de trabalho, pelos então quinze Estados-membros da UE nos Conselhos de Colónia (3 e 4 de Junho de 1999) e Tampere (15 e 16 de Outubro de 1999).

Para além de uma composição abrangendo não apenas chefes de Estado e de Governo mas também representantes do PE, dos parlamentos nacionais e da Comissão Europeia, a Convenção acolheu, a título de observadores, representantes do Tribunal de Justiça das então Comunidades Europeias e do Conselho da Europa, devendo também os seus trabalhos contemplar a audição do Comité Económico e Social, do Comité das Regiões e do Provedor e ainda de outras entidades, grupos da sociedade civil e peritas/os que considerasse relevantes para o cumprimento da missão de que se encontrava incumbida.

Para além disso e com a preocupação de conferir a máxima transparência ao processo, os resultados dos trabalhos da Convenção deveriam ser disponibilizados ao público logo após as reuniões, o que efectivamente aconteceu.

Por ocasião da primeira reunião da Convenção, em 17 de Dezembro de 1999, foi criado um endereço de correio electrónico específico (fundamental.rights@consilium.eu.int) para utilizadores externos à Convenção para o qual convergiram os documentos contendo as posições das ONG designadamente das ONGDM europeias. Estes documentos foram circulados formalmente aos membros da Convenção – como atestam as cotas atribuídas às tomadas de posição da AFEM.

O “método convencional” foi novamente adoptado quando da reforma dos Tratados Europeus em 2003.

Até hoje este foi o método que maior transparência conferiu aos debates e tomadas de decisão no quadro da União Europeia.

Eventos organizados pela PpDM

Uma das “mães” invisíveis da Europa social da União Europeia, a advogada feminista belga Éliane Vogel-Polsky, fez todo um trabalho em torno do artigo 119º do Tratado de Roma, relativo ao combate à desigualdade salarial entre mulheres e homens, um dos direitos que se veio a consolidar no artigo 23.º da Carta. Por isso, no contexto do projeto Connect Europe, a PpDM está a organizar a projeção de um documentário sobre a vida de Éliane, seguido de um debate com a eurodeputada e antiga Secretária de Estado dos Assuntos Europeus Margarida Marques e a realizadora do documentário e fundadora do primeiro think tank feminista europeu (Gender+5), Agnés Hubert. Este debate será moderado pela jornalista da Euronews, Isabel Silva e terá lugar no Espaço Heden, em Lisboa, no dia 20 de setembro.

Éliane Vogel-Polsky bateu-se ao longo da sua vida pela igualdade salarial e pela paridade, dois direitos que sobressaem no artigo 23.º da Carta. Para aprofundar estas temáticas e debater como portenciar a  Carta, a PpDM está a organizar uma reunião com Pedro Bacelar de Vasconcelos, Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias na Assembleia da República, no dia 19 de setembro, uma vez que este foi Vice-Presidente da Convenção para a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, em representação do então Primeiro-Ministro António Guterres (1999/2000).

No dia 20 de setembro, a PpDM está a promover um debate com a eurodeputada pelo Partido Socialista Maria Manuel Leitão Marques, antiga Ministra da Presidência e da Modernização Admnistrativa, com o portfólio da igualdade entre mulheres e homens, e Isabel Romão, perita em igualdade entre mulheres e homens e membro do Grupo de trabalho Mulheres na Política do Lobby Europeu das Mulheres, no Gabinete do Parlamento Europeu em Portugal. Este debate, que será moderado pela jornalista da Euronews Isabel Silva, irá focar-se na paridade e na desigualdade salarial na Europa. Irá contar ainda com a participação de representantes das organizações da sociedade civil parceiras do projeto Connect Europe.

Em suma, serão dois dias dedicados aos direitos fundamentais na Europa, que irão tornar visível o pensamento, a militância e o trabalho de mulheres europeias pelos seus direitos e a importância da Carta dos Direitos Fundamentais como um instrumento indispensável que deve ser utilizado por cidadãs, cidadãos e organizações da sociedade civil.

Com um novo Parlamento Europeu e uma nova Comissão a entrar em funções em novembro, é mais importante que nunca fazer ouvir as vozes das mulheres na Europa, com uma agenda feminista clara por parte das organizações de mulheres da sociedade civil europeia e, seguindo o exemplo de Éliane Vogel-Polsky, utilizar todos os instrumentos ao nosso dispor para realizar na prática os direitos das mulheres e raparigas.

É possível descarregar aqui o calendário completo dos dias 19 e 20 de setembro.

 

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